quinta-feira, 11 de julho de 2013

Dieter Appelt, 1977


PAPYRUS OXYRHINCHUS

A ler um livro de Aquane de Éfeso (Cerca de 540-470 A.C.), que traz o pomposo título de “Papyrus Oxyrhinchus”, a morte se esgueira trôpega pelas paredes de Siracusa.

A morte, por causa da leitura doPapyrus Oxyrhinchus”, se distraiu e acaba de ser esmagada por um trem, por isso veio parar com a gadanha no Paraíso. 

A morte e sua boca escorrendo sangue de tanto banquetear-se com tudo aquilo que ousou respirar, durante milênios, na Terra devastada. 

Se no Paraíso só podem estar os que morreram, que fará a morte agora que está morta? Ainda presa nas ferragens retorcidas do trem, será árduo para ela desfazer-se de tanta ignomínia acumulada em sua urna de incurável podridão.

O que salva é saber que a música vence a morte.

George Krause, 1980




A IGUANA DE CABEÇA RASPADA

Eu e a iguana de cabeça raspada
entramos no Paraíso com os olhos apodrecidos,
sorvemos água fresca da talha.
Os meus olhos, quando eu era vivo,

eram duas bagas de chuva,
e a brisa, que ladrilhava o meu pulmão,
era a mesma que estufava o velame da barca.
A iguana, quando era viva,

devorava os que esqueciam de sonhar.
É cômico levar tudo a sério:
já fiz o percurso de verme a homem,

e muitas coisas em minhas fibras nervosas
ainda são da mesma casta do verme:
muitas coisas, menos a voz e o luar.


 
Ver a exposição Nautikkon,

de Fernando José Karl